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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Elvis Presley, por Bono

Rolling Stone – Os 100 Maiores Artistas de Todos os Tempos

De Tupelo, Mississippi, de Memphis, Tennessee, veio este cara verde, mulherengo, vestido de couro, com sombra no olho – um branquelo caminhoneiro elegante que deve ter arriscado a própria pele para poder se comportar de um modo tão negro e se vestir de modo tão gay. Não estamos falando de Nova York ou mesmo Nova Orleans; estamos falando de Memphis nos anos 50. Isso foi punk rock. Foi revolta. Elvis mudou tudo – musicalmente, sexualmente, politicamente. Em Elvis, você tinha a coisa toda junta; está tudo naquela voz e naquele corpo, ambos elásticos. Enquanto ele mudava de forma, o mesmo acontecia com o mundo: ele era o ícone estilo anos 50 que representava o que os 60 eram capazes, e então repentinamente não era mais. Nos anos 70, ele transformou a celebridade em um esporte violento, mas de um modo interessante, quando mais ele se aproximava da Terra, mais divino se tornava para seus fãs. Suas últimas performances demonstram uma voz ainda maior que seu estômago; você derrama lágrimas verdadeiras enquanto o messias da música canta botando seu coração para fora, transformando o cassino em um templo. Em Elvis, você tinha a receita do rock and roll. A altivez – altivez do gospel. A lama – do Delta, o blues, a liberação sexual. Controvérsia. Mudando o modo como as pessoas viam o mundo. Está tudo lá em Elvis. Eu tinha oito anos quando vi o especial de sua volte em 1968 – o que foi provavelmente uma vantagem. Eu não tinha capacidade crítica para separar os diferentes. Elvis em diferentes categorias ou perceber as contradições. Basicamente, tudo o que eu quero de uma guitarra, um baixo e uma bateria estava presente: um artista incomodado com a distância da sua platéia; uma pessoa que fez um prisma das lentes de maior ângulo da fama; uma sexualidade equiparada somente pela sua sede por instruções divinas. Mas, é sua dança elástica e espástica o mais difícil de explicar – quadris que oscilavam da Europa à África, que é todo o sentida da América, acho eu. Para um garoto irlandês, a voz podia ter explicado a sexualidade dos Estados Unidos, mas a dança exemplificou a energia deste novo mundo prestes a ferver e escorrer, escaldando o resto de nós com novas idéias sobre raça, religião, moda, amor e paz. Certa vez, encontrei-me com Coretta Scott King, John Lewis e alguns outros líderes do movimento pelos direitos civis americanos, e eles me lembraram do apartheid cultural contra o qual o rock and roll se voltava. Acho que o caminho que eles tiveram que percorrer seria muito mais íngreme, se não fosse pelos avanços raciais que a música negra estava fazendo sobre a cultura pop branca. Elvis já estava fazendo o que o movimento pelos direitos civis exigia: quebrando barreiras. Ninguém pensa em Elvis como alguém político, mas isso é política: mudar o modo como as pessoas vêem o mundo. Nos anos 80, o U2 foi para o Sun Studios, em Memphis – o palco do big bang que deu origem ao rock and roll. O descobridor da música de Elvis, Cowboy Jack Clement, abriu o estúdio para que pudéssemos gravar algumas faixas entre as mesmas quatro paredes em que Elvis gravou “Mystery Train”. Ele encontrou o velho microfone valvulado que o Rei havia usado; o reverb era o mesmo: era um lugar pequeno, como um túnel, mas havia uma certa clareza no som. Dá pra ouvi-los naqueles discos da Sun, e esses são os melhores para mim. O Rei ainda não sabia que era o Rei. Elvis não sabe onde o trem vai levá-lo, e é por isso que queremos ser os passageiros. Jerry Schilling, o único membro da Máfia de Memphis a não vendê-lo, me contou que quando Elvis não se sentia bem, deixava a casa grande e ia para sua pequena academia, onde havia um piano. Sem ninguém por perto, só cantava gospel. Ele era o cara mais feliz, quando cantava a sua volta ao caminho da segurança espiritual. Mas, não durava o bastante. O ódio de si mesmo o aguardava quando ele retornava a casa, onde Ra visto atirando em suas TVs, a Bíblia aberta na grande ode ao amor escrita por São Paulo, ‘Coríntios 13’. Elvis claramente não acreditava que a graça do Senhor era grande o suficiente. Alguns comentam que foi o exército, outros que foi Hollywood ou Las Vegas que partiram seu espírito. Acho que provavelmente foi muito mais seu casamento ou sua mãe – ou uma fratura mais sutil e antiga, como a perda de seu irmão gêmeo, Jesse, no nascimento. Ou talvez tenha sido apenas o enorme peso da fama desabando sobre ele. Creio que seu período em Vegas é subestimado. Para mim foi o mais emocionante. Naquela altura, Elvis claramente não tinha o controle de sua própria vida, e mesmo assim havia uma incrível empatia no palco. A grande voz de ópera de seus últimos anos – esta é a que me dói de verdade. Por que queremos que nossos ídolos morram na cruz que eles próprios fizeram, e se não morrem pedimos nosso dinheiro de volta? Mas, você sabe, Elvis engoliu a América antes que a América o engolisse.”

Do site: www.ultraviolet-u2.com  
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